sábado, 11 de março de 2017

O Traje Académico nas Tunas - Reflectir sobre a tra(i)dição.

O traje académico não serve para identificar praxistas, tunos, aficionados do clube, partidos políticos, opções sexuais e quejandos.
Ele existe e foi criado, como tal, para identificar o foro académico, a condição de estudante, portanto. Nem mais, nem menos. E sublinho: nem mais.
Assim, faria todo o sentido que as tunas que o usam não lhe anexassem quaisquer invenções ou o travestissem com gravatas, meias e lencinhos às cores, colheres nas gravatas, barretes ou batas brancas, entre outros, para além da quantidade de decorações natalícias, nas lapelas, que o carnavalizam.


O traje académico não é um traje de tuna, per si. É, historicamente o traje que associamos às tunas (grosso modo) portuguesas, porque, sendo constituídas por estudantes, estes, usavam o uniforme corporativo que assim os identificava: como alunos (e não como tunos). Não precisavam de vaidosos artificialismos para dar nas vistas e se diferenciarem a todo o custo de outras tunas. Respeitavam algo que, para muitos, parece ser apenas uma coisa gira da boca para fora: tradição.

E o mesmo se passava com os orfeões académicos, por exemplo.
Havia, contudo, uma única diferença: muitos usavam, no braço, umas fitas da cor dos seus estudos (nada a ver com tunas, mas com a tradição estudantil).

A Tuna tem toda a liberdade de criar um traje que a identifique como tal; um traje único que traduza a sua actividade e, sobretudo (neste caso de tunas estudantis), a sua natureza académica (o espanhóis têm um que é apenas para tunas - e que nunca foi traje académico).
Se a tuna opta pelo traje académico, deveria respeitá-lo tal como ele é.

E, nesse sentido, cito as palavras do ilustre amigo e investigador tunante, Eduardo Coelho:


" O traje é académico - não praxístico nem tunístico.
Se uma Tuna optar por se apresentar de capa e batina [ou traje equivalente, acrescentamos nós], deve respeitá-la integralmente na sua forma e convenções de uso.
Admito, porém, que, dada a especificidade da actividade, possa haver pontuais excepções - como seja o caso das pandeiretas ou o pousar das capas no chão à frente da tuna.

Tuno não é grau na hierarquia da praxe, de forma que alegar a condição de tuno para se usar o traje de uma forma excepcional fora da estrita actividade tuneril é o mesmo que invocar a condição de bêbado ou chulo. Não vale a ponta de um corno.

E mesmo que seja esteticamente mais interessante encher a a lapela de pins (o que é altamente discutível), nenhuma convenção de uso da capa e batina remotamente autoriza tal coisa.

Organize-se internamente a tuna como quiser, com os seus graus, ritos e hierarquia que bem entender. Escolha livremente o seu repertório. Aceite ou rejeite quem lhe apeteça por critérios que só a ela dizem respeito e sem dar satisfações a rigorosamente ninguém.
Mas respeite o património que é de todos. Em defesa deste, todos têm o direito - e diria mais, o dever de intervir, exigindo o respeito que a tradição merece, seja caloiro ou dux-veteranorum, ou até mesmo ex-academista.

Não. A tuna não tem o direito de fazer TUDO o que lhe der na real veneta. E muitas das confusões vêm de a tuna também se querer meter em terrenos que não são os seus, arrogando-se direitos que não tem, invocando o estatuto de tuno - que não é de praxe - para justificar toda a estupidez que passe pela cabeça de alguns iluminados.

Sim, porque lâmpadas fundidas há em todos os lados."[1]


Portanto, que me desculpem as tunas e os tunos amigos pela frontalidade, mas, as coisas são como são.
O princípio estapafúrdio dos regimes de excepção que alguns códigos de Praxe contemplam não fazem sentido algum; isto para além de não ter qualquer nexo meter tunas num código de Praxe (isto para não falar nas tunas que assim consentem).

Sob esse prisma, cada grupo e actividade diferente poderia alegar direito de alterar o traje da sua academia, para melhor identificar os seus membros e actividade; os do teatro, do grupo desportivo (e conforme cada desporto), clube de jornalismo, xadrez, tertúlia literária, grupo de rock, de fados, orquestras diversas......

Não, o traje académico deve ser apenas aquilo que é: traje que identifica o estudante. E de traje, o estudante pode fazer muitas coisas, desenvolver N actividades, sem precisar de alterar o uniforme.



Dura Praxis Sed Praxis tem precisamente esse sentido (pervertido e espezinhado pelos organismos de Praxe que permitem todas aquelas excepções ao seu uso, nomeadamente pelas tunas - quando, como acima dissemos, as tunas nem sequer têm de constar dos códigos nem a eles estarem sujeitas), ou seja a lei (a Praxe) é igual para todos; dura porque não permite desigualdades e benefícios a uns em detrimento de outros. A lei é para todos e a todos trata, ou deveria tratar, por igual.
Portanto, quem quer usar traje académico, deveria usá-lo segundo as regras que regem os demais estudantes.

No casos em que se trata do traje nacional (vulgo "capa e batina"), deixa-me consternado e triste ver como algumas tunas tratam, com leviandade e despropósito, esse património histórico que a todos diz respeito, porque a todos nós pertence.




[1] In Tunos&Tunos (grupo do FB),post de 29 Novembro de 2016